Ao
longo de 2015, muito se ouviu falar a respeito do ajuste fiscal, ou seja, da
necessidade de readequação das despesas governamentais em relação à arrecadação
de impostos. Essa era uma medida de política econômica fundamental, uma vez que as receitas diminuíram substancialmente ao longo de 2015, em linha com o processo de retração da atividade econômica. Todavia, as contenções dos gastos
foram marginais e serviram apenas para impedir um resultado ainda pior das
contas do Setor Público (União, estados e municípios): déficit de 1,9% do PIB
no conceito primário. Mesmo que o pagamento das chamadas “pedaladas fiscais” seja
desconsiderado para fins de apuração, ainda assim, o rombo teria sido maior em
relação ao de 2014 (-0,6% do PIB).
O
objetivo desse texto é mostrar como o engessamento dos dispêndios da União
dificultam as tentativas de controle da sua expansão.
Os
gastos governamentais podem ser divididos de duas formas. Os chamados “obrigatórios”
têm como principal característica a garantia de realização por dispositivos
legais ou constitucionais. Nessa rubrica, é possível destacar, por exemplo, as
transferências para estados e municípios, os benefícios da Previdência Social
e o pagamento de salários e encargos. Já os “discricionários” permitem
flexibilidade por parte do gestor com relação à execução. Nesse caso, estão
incluídos o custeio do governo e os investimentos.
O
gráfico abaixo mostra a evolução da participação dos gastos considerados obrigatórios
no total da despesa primária do governo federal ao longo dos últimos anos. Os dados foram retirados de uma apresentação recente feita pelo Ministério da Fazenda. Ainda que somente uma parte dos gastos totais do Setor Público seja
levada em consideração, essas informações já fornecem uma importante dimensão
do problema analisado.
Participação dos gastos obrigatórios no total da despesa primária do governo federal
(Em %)
Há
dois elementos que chamam a atenção na série histórica acima. Em primeiro
lugar, o peso das despesas obrigatórias é muito elevado. Por exemplo: de cada
R$ 4 de gasto primário federal, mais de R$ 3 são rígidos. Em segundo lugar,
essa proporção praticamente não se alterou ao longo dos últimos anos. O governo
federal, portanto, ao longo dos últimos 14 anos, não se engajou em um esforço de reforma na composição dos seus dispêndios. Isso não ocorreu nem
mesmo em períodos de intensa crise (como em 2009 ou no período 2014-2015), onde
há maior propensão para a ocorrência de mudanças estruturais.
A
explicação para esse fenômeno passa pelo elevado grau de rigidez das despesas
obrigatórias. Eventuais alterações em sua estrutura apresentam custos políticos, uma vez que
requerem a formação de uma maioria para sua alteração. A tarefa é ainda mais
complicada quando há garantia Constitucional, pois necessita-se de maioria qualificada (2/3 do total dos votos) nas duas casas do Congresso Nacional (duas votações na Câmara e no Senado), além da chancela da Presidência. Em
função dessa característica, o ajuste fiscal acaba recaindo sobre as despesas
discricionárias, pois essas podem ser alteradas de acordo com a vontade do
governo. No entanto, essa ação acaba, muitas vezes, penalizando os investimentos
produtivos.
É
fundamental, portanto, alterar a estrutura do gasto público, de modo a torna-lo
menos rígido. Todavia, isso requer um grande consenso em torno de sua
importância para equilibrar as contas do governo. Trata-se de uma reforma essencial para gerar crescimento econômico sustentado no futuro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário