terça-feira, 18 de outubro de 2016

Ainda sobre a PEC 241: por que impor um limite para o pagamento de juros (e amortizações) da dívida do governo é uma má ideia?



Conforme já explicamos em outros textos, o atual texto da Proposta de Emenda à Constituição 241 impõe um limite para a expansão dos gastos primários federais, dado pelo IPCA do ano imediatamente anterior, ao longo dos próximos 20 anos. Todavia, essa política pode ser revisada transcorridos 10 anos de sua aprovação pelo Congresso Nacional.


Vários elementos da PEC foram amplamente discutidos ao longo das últimas semanas, mas ainda existem dúvidas. Entre as mais recorrentes, uma ganha destaque: por que o governo também não impõe um teto para as despesas incorridas com o pagamento do serviço (juros e amortizações) de sua dívida? O objetivo do presente texto é mostrar que essa regra traria prejuízos imensuráveis para a economia brasileira.


Na prática, a adoção dessa medida significaria o abandono do Regime de Metas para a Inflação no Brasil. É importante lembrar que o Comitê de Política Monetária (COPOM) dispõe de instrumentos para perseguir o alvo estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) no tocante à variação anual do nível de preços, e o principal deles é a taxa básica de juros. A SELIC, inclusive, serve como balizador para remunerar alguns dos títulos da dívida do governo.


Se, porventura, o governo determinasse um limite muito abaixo do que é pago atualmente com o serviço da dívida, o COPOM certamente necessitaria reduzir, e muito, a taxa SELIC para alcançar esse intento. Contudo, observaríamos grandes pressões sobre a inflação, o que acarretaria o descumprimento da meta, atualmente em 4,5% ao ano, com intervalo de tolerância de dois pontos percentuais para mais ou para menos. Além disso, caso a retomada da demanda não seja acompanhada pela expansão da oferta, a inflação será novamente pressionada. Nesse caso, o COPOM não poderia aumentar os juros caso o limite fosse extrapolado, pois isso acarretaria um custo mais alto da dívida.


Há também os casos onde a taxa de juros dos títulos da dívida governo são determinados pela lei da oferta e da demanda. O gráfico abaixo mostra a variação da taxa de juros para a compra dos títulos do Tesouro Direto na modalidade IPCA+ (antiga NTN-B Principal) com vencimento em 2035. Aqui, o poupador que deseja emprestar seu capital ao governo obtém a reposição plena do IPCA mais uma taxa de juros estabelecida no momento em que o título é adquirido.

Taxa de juros dos títulos do Tesouro Direto na modalidade IPCA+ (antiga NTN-B Principal)
(Em %)

Em momentos de maior confiança e previsibilidade, a procura por esses papeis tende a ser maior, o que significa taxas de juros mais baixas. Entretanto, quando a incerteza sobre os rumos da economia cresce, a procura pelos títulos naturalmente se reduz. Para compensar esse efeito, os juros aumentam. Essa variável pode ser interpretada, portanto, como um indicador capaz de medir o riscos inerentes à economia brasileira. 

Quanto mais deterioradas as condições de mercado, maior seria a lacuna existente entre o que o governo poderia pagar para cumprir o teto do pagamento do serviço da dívida e a necessidade de obtenção de recursos para o satisfazer suas obrigações fiscais. A depender da magnitude, não haveria outra opção a não ser declarar um calote, cujos efeitos seriam devastadores sobre a economia.

Portanto, o estabelecimento de um limite para o pagamento de juros e amortizações da dívida do governo é totalmente conflitante com o Regime de Metas para a Inflação.

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