sexta-feira, 31 de julho de 2015

Por que Gamberini está errado? Uma breve discussão sobre taxa de câmbio

Recentemente, o jornalista Rodolfo Gamberini, âncora do Jornal da Gazeta, afirmou que a taxa de câmbio não é a mais alta dos últimos anos. De acordo com a linha de raciocínio do apresentador, é necessário deflacioná-la por algum índice de preços (como, por exemplo, o IGP-M da FGV) para obter seu valor “corrigido”. Entretanto, esse cálculo incorre em um erro grosseiro, como será visto mais adiante. O link para acessar a declaração é esse.

Para compreender esse problema, é necessário definir, primeiramente, o que é taxa de câmbio. Trata-se do valor da moeda doméstica em termos da moeda estrangeira. Dito de outra maneira, é uma medida do poder de compra do Real em relação ao Dólar (ou entre duas moedas quaisquer). Atualmente, um Dólar equivale a R$ 3,42.

Dito isso, convém destacar a diferença entre os conceitos nominal e real. A definição supracitada diz respeito ao primeiro. Seu uso, no entanto, apresenta algumas limitações importantes, pois não contempla o poder de compra de uma forma abrangente, dada pela variação geral do nível de preços (inflação). Para superar esse problema, utiliza-se a taxa de câmbio real, que pode ser definida da seguinte forma:

Taxa de câmbio real = taxa de câmbio nominal x (preços externos / preços internos)

Com o intuito de facilitar a compreensão, vamos supor que a taxa de câmbio nominal se mantenha constante. Caso a inflação no Brasil avance a taxas mais rápidas em comparação com os Estados Unidos, a razão entre parênteses diminui. O resultado é uma taxa de câmbio real menor (mais valorizada), o que indica que está relativamente mais barato comprar nos Estados Unidos. Nesse caso, vale a pena aumentar as importações, uma vez que as mercadorias nacionais estão mais caras. Se o caso contrário fosse válido, haveria incentivos para a exportação, dado que o câmbio se desvalorizou.

O gráfico abaixo mostra a taxa de câmbio nominal e real desde janeiro de 1999 (período em que o câmbio deixou de ser fixo no Brasil). O que se percebe é que a diferença entre ambas cresceu ao longo do tempo em favor da primeira, num claro indicativo de que os preços brasileiros aumentaram mais rapidamente em relação aos americanos. Em março de 2003, os dados apontam para um valor de R$ 2,47, e não R$ 7,33.

Taxa de câmbio nominal e real (dólar americano)
(Em R$ / US$)
Em suma, o jornalista incorreu em um duplo erro: primeiro porque sua proposição de correção da taxa de câmbio se dá em apenas uma das pontas - não levando esse mesmo fator em consideração para os EUA -. Segundo foi a sua interpretação: aumentos no diferencial de preços em favor do Brasil tendem a tornar o câmbio real menor (mais valorizado), e não maior.

Fontes:
Taxa de câmbio nominal mensal: BCB. (Série 3698 do BCB)
Taxa de câmbio real mensal - dólar americano: BCB (Série 11753). Como o dado está em número-índice, utilizou-se o taxa nominal de janeiro de 1999 (R$ 1,50) como base, e essa foi corrigida de acordo com as variações mensais do indicador.

11 comentários:

  1. parabéns por mais uma postagem sucinta e esclarecedora!O amigo poderia me indicar algum material para estudo sobre câmbio?Sempre me atrapalho com o que valoriza ou desvaloriza o câmbio.Acionista25

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    1. Prezado,

      Já escrevi alguns textos sobre taxa de câmbio aqui no blog mesmo. Por favor, dê uma olhada.

      Há vários estudos diferentes sobre o tema. O que você deseja saber mais especificamente?

      Obrigado pelo comentário.

      Um abraço!

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    2. Obrigado pelo pronto retorno!você corrigiu pelos preços dos produtos,entendi.Se fosse corrigir pela inflação.Sei quem tem formula,mas resumindo pode-se fazer simplificado.EX.:O cambio tá 3.45.Inflação nos EUA 2.No Brasil 9.Então 9-2=7%.A tx de cambio real seria 3.45+ 7%=3,69.Mas vejo que no seu grafico as txs são 3,11 e 1,54.Onde estou errando?.sei que também pode-se corrigir pela tx de juros...Qual seria melhor?Acionista25

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    3. Prezado Anônimo,

      De acordo com a linha de raciocínio desenvolvida no texto, é necessário que esse diferencial de inflação favorável ao Brasil (7% no seu exemplo) seja descontado da taxa de câmbio, ou seja, 3,45 - 7% = 3,21 (nesse caso, houve uma valorização em termos reais). Intuitivamente isso faz muito sentido: como os preços nacionais estão mais caros, vale a pena importar de um lugar relativamente mais barato. Cabe destacar também que o gráfico retrata a evolução acumulada dos preços ao longo do tempo. Como nossos preços avançam mais rapidamente em relação aos EUA, a desvalorização em termos reais é muito menor quando comparada ao câmbio nominal.
      Espero ter contribuído para sanar a sua dúvida.
      Att.,
      Oscar

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  2. O jornalista está errado porque não é jornalista, é militante.
    Tudo o que ele demonstrou com a militância dele é que o governo largou de mão o controle inflacionário por 13 anos.

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    1. Prezado anônimo,

      Essa é uma hipótese que, definitivamente, precisa ser levada em consideração.

      Obrigado pelo comentário.

      Att.,

      Oscar

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  3. Certo, concordo que ele errou na conta, não considerou a inflação do dólar etc.

    Mas o que ele quis dizer, isto é, o conteúdo de sua fala, no limite, estava certo, uma vez que a taxa de câmbio real, embora em trajetória de desvalorização, não está tão desvalorizado quanto em 2003.

    Correto?

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  4. Prezado Artur,

    Pela conta que foi feita utilizando a variação do câmbio real, o último dado aponta para uma taxa de R$ 1,54 (mês de junho). Em dezembro de 2008, a cotação foi de R$ 1,56. Trata-se, portanto, do patamar mais desvalorizado dos últimos seis anos e meio. Essa seria a afirmação correta.

    Obrigado pelo comentário.

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Prezado Oscar, me desculpe, mas sua análise me parece incorreta. Se a inflação da economia Brasileira for maior que a inflação Americana e o câmbio nominal permanecer constante, isso indica que o real está artificialmente mais valorizado que o dólar, ou seja, tá na hora de comprar dólares por em algum momento o mercado irá corrigir, elevando/ajustando o câmbio nominal para o patamar do câmbio real. Exemplo hipotético: Se para produzir 1 kg de batata no Brasil se gasta R$1,00 e nos EUA se gasta um 1 U$ em 2015, por exemplo, então o câmbio real e nominal deveria ser 1Real/1Dólar = 1. Seguindo o raciocínio, se o preço da produção da batata aumentar para R$ 2,00 no Brasil e permanecer o mesmo custo de 1 U$ nos EUA e o câmbio nominal não variar, permanecendo 1, isso significa que o real está artificialmente valorizado com esse câmbio nominal de 1, quando na verdade deveria ser de 2 R$/1U$, ou seja, o câmbio real deve ser 2. Desse modo tem-se o ajuste das moedas e o brasileiro não poderá comprar com 2 reais dois kg de batatas nos EUA, mas sim 1 kg.

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    1. Anônimo,

      Leia novamente o texto e veja o gráfico. A taxa de câmbio real indica que a cotação está bem mais valorizada em relação ao que a taxa nominal sugere.

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