quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Ainda sobre a decisão do COPOM: por que os juros deveriam ter subido?



O COPOM decidiu não alterar a taxa básica de juros da economia brasileira na decisão de ontem, mantendo-a em 14,25% a.a.. Ao longo das últimas semanas, o debate envolvendo a melhor postura a ser tomada por parte da autoridade monetária gerou amplas discussões entre os economistas. Muitos defenderam que a estabilização da SELIC era, de fato, a escolha ótima nesse instante. O objetivo desse texto é contrapor alguns dos principais argumentos utilizados por esses analistas, contribuindo para o debate sobre esse importante tema.


Argumento 1: “O efeito da recessão econômica é suficiente para causar uma pressão deflacionária sobre os preços.”


As medianas das projeções de mercado, de acordo com o Relatório FOCUS, do Banco Central, mostram um quadro concomitante de previsões mais negativas para o PIB e de deterioração das  expectativas para o IPCA em 2016 e 2017, conforme os gráficos abaixo.

 Expectativas para o IPCA em 2016 e 2017
(Var. % em relação ao ano anterior)


Evolução das expectativas para o PIB em 2016 e 2017
(Var. % em relação ao ano anterior)


Por que então a diminuição da atividade econômica não tem sido suficiente para manter os preços bem comportados? É importante lembrar que o BC não pondera apenas a variação do nível de atividade na sua decisão sobre os juros, mas sim o hiato do produto. Esse conceito representa a diferença entre o PIB e o crescimento potencial, ou seja, o quanto a renda pode expandir sem provocar pressões inflacionárias. As estatísticas do IBGE mostram que os investimentos (formação bruta de capital fixo) registraram quedas cada vez mais acentuadas ao longo dos últimos trimestres. Esse movimento deve permanecer em 2016, uma vez que os índices de confiança permanecem em patamares historicamente baixos. Ou seja, mesmo com o desaquecimento da economia, há uma sinalização bastante clara de que o Brasil está reduzindo o seu potencial de expansão rapidamente, o que atua para "fechar" o hiato.

Variação do PIB e dos investimentos
(Var. % em relação ao mesmo trimestre do ano anterior)

Argumento 2: “A elevação dos juros pressionará ainda mais a relação dívida/PIB”.


Convém lembrar que apenas uma parte da dívida bruta (cerca de 40%, conforme o gráfico abaixo) é pós-fixada, ou seja, varia de acordo com os movimentos da Taxa SELIC. Sobre a parcela restante, o efeito não é imediato. No caso da obrigação pré-fixada,  somente quando os títulos são rolados é que o custo para o governo é, de fato, maior.



Participação dos indexadores no total da dívida bruta do Brasil em nov/15
(Em %)



Argumento 3: “A incerteza causada pelo aumento do custo da dívida, decorrente do maior nível de endividamento, levaria ao aumento do Risco-País. Consequentemente, haveria fortalecimento do Dólar em comparação com o Real, causando mais inflação”. 

É importante lembrar que quando o Banco Central do Brasil eleva a SELIC, o diferencial de juros entre o Brasil e outros países, como os Estados Unidos, acaba aumentando, tornando o mercado nacional mais atrativo para aportes em moeda estrangeira. Esse efeito diminui as pressões em torno da desvalorização da taxa de câmbio. Além disso, sabe-se que a tendência é de aperto monetário por lá, ainda que não tão intenso quanto previsto há meses atrás. Por conseguinte, manter a atratividade para o investidor estrangeiro vai requerer, naturalmente, que os juros sejam maiores aqui.

Vários economistas afirmaram que o problema da inflação deve ser combatido pelo lado fiscal, e não pelo lado monetário. Essa frase, na teoria, está perfeitamente correta. No entanto, não se vê qualquer disposição por parte do governo federal em conduzir um ajuste efetivo nas contas públicas, ainda mais diante da gravidade da crise política. Ou seja, com a primeira alternativa completamente obstruída, não há outra solução a não ser utilizar um amargo remédio: o incremento da taxa de juros.


Quanto maior é a demora por parte do Banco Central em agir, mais os componentes relacionados às expectativas e à inércia inflacionária ganham espaço. E maior será o custo por parte da autoridade monetária para recolocar a inflação no centro da meta. Em suma, a Taxa SELIC deveria ter subido na reunião de ontem do COPOM.


Fonte: Expectativas para o PIB e o IPCA (Relatório FOCUS)
PIB e investimentos (IBGE)
Participação dos indexadores na dívida bruta (Banco Central, quadro XXI)

2 comentários:

  1. Oi Oscar! Uma duvida com relação ao primeiro argumento: Ha alguma serie que me de o hiato do produto e o pib potencial?

    Laura

    ResponderExcluir
  2. Oi, Laura! Tudo bem?

    Não conheço nenhuma série histórica "oficial" para o PIB potencial do Brasil. No entanto, é possível utilizar as previsões mais longas para o PIB efetivo do Relatório FOCUS como uma aproximação para o PIB potencial. A lógica é a seguinte: como é difícil prever o nível de atividade para 2019 (estimativa mais longa disponível), os analistas estimam o crescimento de longo prazo da economia brasileira. O número atual é 2,0%. Todavia, em função da deterioração recente dos fundamentos macroeconômicos, acredito que o valor seja bem mais baixo do que esse.

    Obrigado pelo comentário!

    ResponderExcluir