A
conta "Transações Correntes" do Balanço de Pagamentos de um
determinado país representa o registro sistemático do comércio de bens e serviços
e do fluxo de rendas com outras nações num determinado período de tempo. Caso a rubrica apresente déficit (importações maiores que exportações), diz-se que a poupança externa é
positiva. Isso significa que a geração interna de poupança é incapaz de financiar o
investimento da economia, sendo necessário que ela absorva mais recursos vindos de fora para essa finalidade.
É
necessário lembrar que déficits nas Transações Correntes, por si só, não
necessariamente representam algo ruim para a economia. Se houver, pelo lado da
Conta Capital e Financeira, um ingresso de capitais (na forma de Investimento
Estrangeiro Direto e outras modalidades) suficiente, não haverá qualquer tipo
de problema do ponto de vista da sustentabilidade das contas externas. Entretanto, quanto maior for
o déficit em Transações Correntes, menor é a disposição dos financiadores em
cobrir a diferença.
Em dezembro, o déficit em Transações Correntes alcançou seu maior patamar em 13 anos (4,17% do PIB). A
dinâmica dessa variável passou a gerar preocupação principalmente a partir de
2013, uma vez que os ingressos de recursos via Conta Capital e Financeira não apresentam crescimento sustentado. Vale ressaltar que a situação só não se agravou
anteriormente porque, até 2011, os preços das commodities mantinham uma trajetória ascendente, o que gerou
grandes excedentes na Balança Comercial. A compreensão da dinâmica da deterioração das
Transações Correntes passa pela piora da balança comercial de produtos
manufaturados, conforme o gráfico abaixo.
Transações Correntes (% do PIB em 12M) e Saldo da Balança de Manufaturados (US$ milhões)
Por
um lado, desde 2008, as exportações dos produtos de maior valor agregado do
Brasil "andam de lado". Nesse sentido, a eclosão da crise
financeira internacional fez com que, de maneira geral, vários países gerassem
um crescimento mais voltado para dentro (a taxa de crescimento das importações
mundiais caiu abruptamente em relação ao pré-crise). Além disso, o aumento da
concorrência internacional (sobretudo dos produtos chineses) também explica
esse desempenho.
O
elemento chave para o diagnóstico da piora do saldo comercial dos manufaturados se justifica, portanto, pela majoração das importações. Em primeiro lugar, a manutenção de uma taxa
de câmbio sobrevalorizado ao longo dos últimos anos gerou, pelo lado do
consumo, um efeito riqueza que incentivou as compras no exterior. Soma-se a
isso o conjunto de medidas adotadas pelo governo para estimular a demanda, num
modelo de crescimento que foi aprofundado a partir da crise. Essa escolha
acabou penalizando o lado da produção, que viu seus custos aumentarem
abruptamente (ver texto "Pressão de custos sobre a indústria").
O ajustamento das Transações Correntes irá requerer
uma transformação econômica considerável, a partir de políticas que favoreçam o lado da
oferta. Todavia, mesmo que algo seja feito logo, os efeitos ainda levarão tempo para serem sentidos. Aumentar a poupança interna (sobretudo a pública) também melhoraria esse quadro.
Fonte: Transações Correntes (% do PIB em 12M): Série 11726 do SGS (Banco Central).
Exportações e importações de manufaturados: FUNCEX.
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