sábado, 18 de março de 2017

Estimativa para a taxa neutra de juros do Brasil

A Nota mais recente da reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM) aborda, entre outras coisas, o debate envolvendo a taxa natural (estrutural ou neutra) de juros da economia brasileira. O objetivo deste artigo é abordar o que a constitui, além de replicar a estimativa feita no trabalho de Fernando de Holanda Barbosa, Felipe Camêlo e Igor João, cujo título é “A Taxa de Juros Natural e a Regra de Taylor no Brasil: 2003-2015”, publicado na RBE.

Em linhas gerais, a taxa neutra de juros é aquela que não provoca pressões inflacionárias ou desinflacionárias, ou seja, é o patamar de equilíbrio da economia. Ao todo, são três componentes. O primeiro deles é o juro internacional, que serve como benchmark (referência) para o investidor estrangeiro. Na análise do custo de oportunidade entre aplicar o capital em seu país de origem e no exterior, esse agente leva em consideração outros dois fatores: o risco soberano, ou seja, o prêmio pago para compensar o risco de default (calote) e o risco cambial, que representa o ressarcimento necessário para que o poupador assuma o risco de investir em outra moeda, uma vez que, na grande maioria dos casos, as taxas de câmbio são flutuantes, e, no momento do resgate, a aplicação pode, inclusive, valer menos do que o capital inicial.

Para estimarmos a taxa neutra de juros, utilizamos, na ordem: a fed funds rate dos Estados Unidos deflacionada pela inflação americana acumulada em 12 meses, o Risco-País (dado pelo EMBI+ do Brasil, compilado pelo banco JP Morgan) e o cupom cambial de 1 ano, calculado pela BM&F. Após somarmos essas três variáveis, aplicamos o filtro Hodrick-Prescott (HP), de modo a extrair sua tendência. Como os dados são mensais, utilizamos o padrão do parâmetro para dados com tal frequência (14.400).

Ao compararmos a série estimada da taxa neutra com o juro real Ex-Post, ou seja, a Taxa SELIC menos a inflação acumulada nos últimos 12 meses, podemos verificar qual foi a postura (policy stance) da autoridade monetária ao longo dos últimos anos, de acordo com o gráfico abaixo. Quando a taxa real é menor do que a taxa natural, temos uma política monetária expansionista, ou seja, mais voltada para estimular o nível de atividade e mais leniente com a inflação. Se, por outro lado, a taxa real é maior do que a natural, caracterizamos uma política contracionista. Houve, ao longo dos últimos 13 anos, períodos marcados por forte expansionismo, o que ajuda a explicar os motivos que fizeram com que à inflação média do período fosse superior ao centro da meta.

Em última análise, a taxa neutra de juros está ligada aos diversos fundamentos da economia brasileira. É importante lembrar que ciclo de aperto monetário, que fez com que a SELIC subisse de 7,25% ao ano para 14,25% ao ano, mantendo-se nesse patamar por vários meses, não foi suficiente, até pouco tempo atrás, para gerar efeitos contracionistas sobre a inflação. Atualmente, diante do patamar ainda alto da SELIC e da forte redução da inflação, a política se tornou contracionista.

E o que pode ser feito para reduzirmos a taxa neutra de juros? Destacamos aqui o parágrafo 17 da última Nota da Reunião do BC, que traz à tona exatamente essa discussão: “No que tange à extensão do ciclo, i.e., à redução acumulada da taxa Selic ao cabo do processo de flexibilização monetária, a discussão centrou-se em duas dimensões distintas, ambas relevantes para sua determinação. A primeira dimensão diz respeito à taxa de juros estrutural da economia. Essa taxa depende de fatores como crescimento da produtividade da economia, perspectivas para a política fiscal, qualidade do ambiente contratual e de negócios, eficiência na alocação de recursos via sistema financeiro e qualidade das políticas econômicas. Suas estimativas invariavelmente envolvem elevado grau de incerteza. Por essa razão, avaliações sobre a taxa de juros estrutural da economia necessariamente envolvem julgamento. O Comitê julga que o redirecionamento da política econômica pelo governo, com aprovação e implementação das reformas fiscais, notadamente a reforma da previdência, além de outras reformas e ajustes necessários na economia, pode produzir uma queda da taxa de juros estrutural da economia brasileira. Nesse contexto, o Comitê continuará reavaliando suas estimativas da taxa estrutural de juros da economia ao longo do tempo. Essa dimensão produz mudanças menos frequentes e mais estruturais para a política monetária.

Em suma, para diminuirmos os juros de maneira sustentada, necessitamos avançar no campo das reformas macro e microeconômicas.
 
 

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